Já é carnaval, as ruas da cidade vão sendo tomadas por algum tipo de magia que ocupa todo espaço, ficam cheias de gente que esperou um ano inteiro para poder voltar a ver a cidade que é sua – você só vê o que essa cidade é de verdade, em sua única forma possível e sincera, em fevereiro. 

Lembro do Hugo me dizendo que as pessoas precisam desse período para poderem extravasar porque sem isso elas enlouquecem. O que é loucura nesses dias – a fantasia que se usa no meio da multidão, a vergonha que não se sente de estar com pouca ou nenhuma roupa, o amor que não se conta – é o que a gente deseja viver, por tantas vezes reprimido, e por isso é o que a gente precisa. 

Esse ano, eu prometi, serei encontrado bêbado todos os dias e não direi a que horas vou voltar e nem vou me importar para onde vou voltar, como criança que se deslumbra com as ruas coloridas e segue um caminho e se perde, vou seguir qualquer bloco e qualquer música, vou acompanhar qualquer outro bêbado que nem eu até onde vamos nos amar e de onde eu não vou mais saber voltar.

Olho para minha amiga Angélica e falo vamos comigo para Santa Cecília comprar flores depois de algum bar ou café, ela me acompanha, me compra um café, eu começo a contar histórias sem sequer conseguir parar para respirar porque elas não me dão esse tempo, eu falo que tenho que ir, vou para a minha vó, quero levar uma plantinha para ela, me ajuda a escolher.

No meio da multidão eu pergunto para minha amiga para onde você quer ir? Ela me responde devolvendo a mesma pergunta e eu não sei, falo. Eu quero ficar sozinho.

Na beira do mar, com as ondas tocando os meus pés e o sol queimando minha pele, construo um barco com madeira que encontrei no caminho, eu vou para o fundo e quando não vejo mais a terra e onde ninguém pode me ver, mergulho primeiro os pés, e depois entro na água com o resto do corpo, me deixo afundar e, sem nunca chegar ao final, eu sigo afundando e vendo, cada vez menos conforme a luz da superfície não me alcança, as vidas marinhas que não entendo. 

Volto para a superfície a tempo de um amigo me encontrar, me pegar pela mão e falar vamos nadar sem roupas?

É terça-feira à noite e as pessoas persistem errantes nas ruas, sem um caminho e sem querer se despedir, então elas só andam, bebem mais, dançam por alguns poucos minutos até as pernas cansarem, caem em braços de desconhecidos e caem no chão, por fim. Um homem me encara quando chego ao centro e logo nos beijamos, ele me leva abraçado até a minha cama. Vou à cozinha pegar água e quando volto o vejo deitado, meu cobertor deixa à mostra suas coxas, sua bunda e suas costas, eu chego junto e me deito ao seu lado.

E quando ele vai embora, eu fecho a porta, volto para a cama e abraço o cobertor, aproximando do meu rosto para poder sentir melhor o cheiro que ele deixou.

É carnaval.

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